domingo, 27 de setembro de 2015

Meu segundo mês no Centro de Apoio Social da Carregueira

Há dois meses que me encontro a residir no lar do Centro de Apoio Social da Carregueira. Como já assumi, no início foi muito complicado... (AQUI) mentiria se escrevesse que agora está tudo bem. Acho que isso nunca acontecerá. É como referir que após o acidente que me obrigou a ficar em cadeira de rodas, eu tenha me acostumado e tudo esteja bem. Não, isso não funciona assim. Mas posso dizer que aceitei viver da melhor maneira possível, mediante as circunstâncias, e não ficar eternamente a lamentar-me e á espera do que não vem, até porque sempre tentei ser prático e objetivo.
Perguntam-me com frequência se estou a gostar de estar a viver num lar, a resposta que gostaria de dar, mas nem sempre o faço é: "sim estou, é uma merda, mas melhor não podia estar". Gosto de aqui estar, gosto muito do que faço, gosto dos colaboradoras(es), gosto deste edifício, do lugar, gosto das diretoras técnicas, gosto dos meus colegas de lar, gosto muito desta direção e até já gosto da imagem que me surge através da janela do meu quarto e contemplo durante horas quando acamado. Já sinto as resistentes árvores que compõem a imagem como sendo amigos de longa data. Só nós sabemos o que murmuramos. Foi muito bom tê-las encontrado.
Gosto, gosto e gosto, mas não é a mesma coisa que viver na minha casa, e não é a mesma coisa principalmente por não nos permitirem escolher ser donos das nossas vidas. Se somos dependentes a única saída é ir viver para um lar de idosos.

Mas também existem coisas que não gosto. Uma realidade que desconhecia, e nesse caso desgosto, é o facto da maioria dos meus colegas de lar chegarem em estado de saúde crítico. São muito poucos os que mantêm a sua autonomia e sanidade mental normal. Muitas demências e dependentes. Fico com a ideia que estes lugares servem para substituir as unidades hospitalares.

Também ainda não me sinto confortável com os gritos e cheiros típicos de lares. Principalmente os gritos noturnos, mas chego lá.

Mas esta minha convivência diária com esta realidade fez-me também ver que nem todos os lares de idosos são maus. Nunca gostei de generalizar, é perigoso e injusto fazê-lo, existe gente boa e má em todos os lugares. Obviamente que acontece o mesmo com as estruturas residenciais, mas o certo é que até ao momento não conhecia nenhum caso, pelo contrário, só me chegavam relatos terríveis sobre a maneira como os seus utentes eram tratados. Basta ver as notícias diárias...para ficar a ter uma ideia sobre a nossa triste realidade.

No caso da Estrutura Residencial para Idosos do Centro de Apoio Social da Carregueira tem sido uma agradável surpresa. Muito do mérito da minha boa adaptação pertence-lhes. Posso dizer que já fui passar dois fins-de-semana a casa e já me sinto deslocado. O facto de saber que não tenho o mesmo apoio disponibilizado no Centro conta muito para esse desconforto. Agora vejo o quanto esse factor faz toda a diferença. Vive-se com outra tranquilidade e segurança.

Mesmo sentindo esse desconforto é muito bom voltar ao meu canto. Será sempre um dos meus cantos. Faz-me bem ver o meu canto, pessoas, árvores, comer a minha comida, cheirar os cheiros que só eu sinto, matar saudades da família de corvos que todos os dias sobrevoam a minha casa...

É com muita dor que sinto que esses prazeres estão a deixar de ser uma realidade. As visitas irão começar a ser cada vez mais distanciadas, o desconforto e falta de condições vão afastar-me de vez dos prazeres que por lá ainda mantenho.

Obrigado CAS Carregueira por me terem recebido tão bem e desculpem qualquer coisa.

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